Justiça Itinerante leva cidadania para eremita que vivia em ilha no Rio Madeira
Homem que vivia isolado teve casebre e documentos levados pela cheia do rio; com a chegada do Barco da Justiça, a comunidade se mobilizou para devolver a cidadania ao velho Armando
Uma história inusitada que, como muitas outras, demonstra que a Operação Justiça Rápida Itinerante na região do Baixo Madeira, em Porto Velho, é uma das ações mais exitosas do Judiciário de Rondônia. Desde o último dia 25 de julho, uma equipe dos Juizados Especiais de Porto Velho e órgãos parceiros percorrem as comunidades isoladas ao longo dos rios Machado e Madeira.
Foi nessa viagem que a equipe da Justiça Rápida atendeu Armando Macedo de Brito ou simplesmente “velho Armando”, como é conhecido por todos na região. Ele sempre viveu na ilha de Iracema, quase como um eremita, sem contato com quase ninguém. As únicas pessoas que ele deixava se aproximar eram dois amigos, que, como ele, vivem isolados de todos.
O velho Armando e seu amigo Hamilton, o Baré
Mesmo com a intensidade da cheia, considerada historicamente a maior, o velho Armando se recusava a deixar seu casebre na ilha onde viveu toda sua vida. Com muito custo os amigos o arrastaram de lá, já com a água pelo joelho, num sábado pela manhã. Naquele mesmo dia, horas depois, as águas do rio Madeira levaram para sempre a casa e as lembranças de uma vida inteira. Em terra firme, nas proximidades da ilha de Iracema, no local chamado Tira-Fogo, um casebre de palha foi erguido, à beira do barranco, mas novamente as águas levaram. Então, os três amigos reconstruíram suas casas, lado a lado, mais afastadas da margem, no meio da mata.
Hoje, o velho Armando vive na companhia de um gato malhado e ao lado das pessoas que lhe salvaram a vida. E foi um dos amigos, o Hamildon, conhecido como Baré, que saiu de Tira-Fogo e foi em busca do Barco da Justiça Rápida Itinerante, ancorado na comunidade de Santa Catarina, a cerca de 1,5 km de distância. Procurou a juíza responsável pela operação e depois de explicar a situação, foram todos de imediato ao encontro do velho Armando. Acompanharam a comitiva da Justiça pioneiros da comunidade de Santa Catarina, como o seu Neco, que conhece o velho Armando desde menino e serviu como testemunha no processo para a expedição de uma nova certidão de nascimento.
Segundo a juíza Sandra Silvestre, a verdade é que com as cheias as pessoas perderam tudo e agora um documento faz falta, até mesmo para ter acesso à água, cesta básica, coisas mínimas para ter direito à cidadania. Em Tira-Fogo, a juíza se espantou com a lucidez daquele senhor, que sabia detalhes da sua história, como a hora de seu nascimento e o fato de sua mãe ter morrido no parto. Além disso, contou histórias e compartilhou conhecimentos com todos ali. Para a juíza, aquele foi, certamente, um dos momentos mais marcantes da viagem. "Só esse trabalho, já valeu a viagem. É para resolver problemas assim, que estamos aqui", disse a magistrada. A equipe da Justiça partiu do povoado de Tira-Fogo após a audiência, deixando para trás o Senhor Armando um pouco mais cidadão e a população um pouco mais confiante de que a Justiça existe e é capaz de enxergar onde o povo está.
Assessoria de Comunicação do TJRO