Invisíveis até sábado, 3 de agosto, William, 15 anos, Sirley, 11, Richard, 8 e Gladis, de 5 anos, passaram a existir como cidadãos e podem a partir de agora, conforme relata a mãe Gabriella, finalmente frequentar a escola. “Eu quero muito quero que eles estudem”, diz emocionada. A família morava no sítio, na linha 18, próximo à Surpresa, distrito de Guajará-Mirim. As crianças nasceram com a ajuda de parteiras, que inclusive serviram de testemunhas para que o registro tardio das crianças pudesse finalmente ser lavrado, durante a Justiça Rápida Itinerante no Vale do Guaporé.
Gabriella se separou do marido e voltou a morar com o pai em Surpresa e aproveitou a passagem do barco-hospital Walter Bartolo, parceiro da Justiça na missão, para finalmente buscar o direito fundamental dos filhos: a certidão de nascimento. “É uma questão de dignidade e cidadania. Uma coisa impensada para muitos, que constatamos aqui nos rincões do estado. Uma entrega como essa, que envolve histórias de frustrações e preconceitos, toca toda a equipe, sobretudo porque conseguimos entregar os documentos e ver no rosto de toda a família a felicidade de serem atendidos nos seus anseios mais básico”, Thiago Aniceto disse o magistrado, realizado com o sucesso da operação.
Foram 79 atendimentos jurídicos em 10 dias. Mais do que números, a ação do Judiciário de Rondônia, que contou com a parceria do Governo do Estado, representa acesso efetivo à Justiça às populações vulneráveis, ribeirinhos e indígenas. A maior parte dos atendimentos ao longo da operação foi voltada às aldeias: Deolinda, Barranquilha, Sotério e Ricardo Franco. Nos últimos três dias, em Surpresa, uma população formada por brasileiros, bolivianos e indígenas compareceu ao barco. A localidade tem cerca de 1.800 pessoas, só no vilarejo. Com as aldeias próximas chega a 3 mil habitantes.
Nomes como do jovem casal Gabriel Cuellar e Rute Gualy Fernandes, que se casaram e registraram o pequeno Dylan Miguel Cuellar Fernandes, comprovam a miscigenação. Ou ainda Olvídeo Cangaty do Carmo e Fernanda Moura do Nascimento, que também se casaram. Ou Anderson Diomei Cortez e Alexia Rocha Guarena, que registraram Lara Beatriz Guarena Cortez, de cinco meses.
Aldeias
Da aldeia Sagarana, visitada pela equipe da Justiça Itinerante para divulgar a chegada do barco, vieram Tooji e Tocopian Oromom. Depois de 22 anos de união e 7 filhos, resolveram se casar. Saíram com a certidão nas mãos.
Outros foram ao barco para correção de documentos por erros em grafia, troca dos nomes de genitores, entre outros. É o caso de Ravi Tem Paranan Canoé Oro Waram Xijen, nascido em dezembro de 2023, filho de Elielsson Oron Waram Xijein e Maria Paula Pijein Arowa Canoé. O nome indígena, herança de seu avô, estava com a grafia errada.
Parteira
“É uma alegria ver essas crianças que a gente ajudou a nascer”, destacou Etelvina Pereira, uma das parteiras que serviram de testemunha no processo de registro tardio dos quatro irmãos.
Logo depois, ela foi buscar o companheiro, João Júnior da Silva, para oficializar a união de mais de vinte anos. Ao receber a certidão de casamento, o presidente da associação de agricultores, agradeceu a presença da Justiça, muito importante para as famílias. “A maioria aqui sobrevive de roça, o que fica difícil viajar, gastar dinheiro na cidade. Quero agradecer o carinho de vocês com nossa comunidade”, disse.
Casamentos
Aliás os casamentos foram os campeões de procura em Surpresa. De várias idades e tempos de convivência, os casais procuraram o barco para obter o documento que legitima a união. É o caso dos jovens Thiago Pereira Camargo de Meireles e Helena Renata de Almeida Camargo, que além de se casarem, registraram o pequeno Hiago Gabriel, de 4 anos.
Francimar Alves da Silva e Rogéria dos Santos Souza capricharam no visual e também levaram o filho para o momento importante.
Já Waldelice Fernandes de Carvalho e Fernando Gomes de Melo estavam entre os casais mais experientes, porém não menos animados.
Saúde
Quem procura a Justiça aproveita para também buscar atendimento de saúde, que na localidade de Surpresa ganhou reforço de mais um médico e um dentista. O barco hospital Walter Bartolo conta na equipe ainda com auxiliar de enfermagem, enfermeiro, biomédica, farmacêutica, além de servidores administrativos para ajudar na triagem.
“Desde que foi criado, em 2016, o barco tem levado esses serviços aos locais de difícil acesso. E sempre que chegamos nas comunidades, somos cobrados pelos ribeirinhos, quilombolas e indígenas sobre os serviços sociais. Por isso a presença da Justiça é essencial”, explica o diretor do barco hospital, Giovani Guastala.
Ao todo foram 249 atendimentos de saúde, um deles ocorreu no meio de uma audiência. Uma grávida, que veio corrigir o registro de um dos filhos e pedir para agendar uma audiência de conciliação sobre alimentos, sentiu dores abdominais e recorreu ao exame de ultrassonografia. Estava tudo bem. A audiência foi marcada e ela obteve a correção dos valores da pensão, que o ex-companheiro não estava cumprindo.
Assessoria de Comunicação Institucional